sexta-feira, 30 de agosto de 2013

Sonhei: sai do banheiro e me esperavas sentado na beira da cama. Ainda nu e ereto.
Acordei: ainda com o dia escurecido e o vento gelado e a rua silenciosa e o desejo pulsando. Não quis acender a luz da sacada, não preciso da companhia de nenhum olhar. Junto com a fumaça do meu cigarro, tentei tragar a tua presença. O que consegui foi nada. Tento agora me lembrar do sonho. Mas sequer me lembro do timbre da tua voz. É possível que eu a tenha sonhado? Meus cigarros tem se acabado rapidamente. Duram menos que o tempo de pensar naquilo que, entre nós, teria sido verdade. Mas a verdade não existe. E a única realidade que tenho de ti é o vício ao qual me devolveu.

domingo, 25 de agosto de 2013

Tenho sido um animal faminto, mas se recusas a me alimentar. E se provo outra carne, me saciarei de ti?

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

A minha língua não é a mesma da qual falam os linguistas. Minha língua é de uma imperfeição que a torna incompreensivelmente limitada. Se tentas me ler, conforme-se: o que digo não lhes é acessível. A língua é demasiadamente humana para conseguir me expressar por completo, pois por dentro sou bicho, animal selvagem, que tem por única linguagem seus rugidos desejosos. Assim, me ouça em cada uma de minhas vírgulas, em cada um de meus pontos e em cada pausa de minha respiração. Pois é apenas no meu silêncio que poderá sentir a rouquidão do meu peito de fera. Peito que não mais ruge por ter se acostumado à angústia desta coleira de língua, que inutilmente lhes tenta falar. 

segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Cada um tem a barata que merece:

Eu percebo que ele se arrasta pelos cantos do quarto. Os outros diriam que animal não poderia ser, pois o apartamento é novo/limpo demais para. Mas eu sei que ele está. Posso ouvir como ele abre espaço por caminhos que não o querem, mas que mesmo assim ele penetra. Me pergunto se também sente-se acuado. Deve ter prazer em me fazer assim. Eu queria dizer que ele não me incomoda e nem perturba. As perturbações que me causa são de outra ordem que não o desconforto. É que me faz não-sozinha, algo que há muito passei a desconher. Mas essa palavra realmente existe? Não sei por quanto tempo ele ainda fica. E se nunca tivesse estado aqui? O problema dos animais é que sempre nos deixam marcas. Se mover cada móvel adiantasse, atiraria todos sacada-a-baixo. Mas isso não o removeria do alcance dos meus ouvidos. E já estou marcada: pois, uma noite dessas , tive companhia para voltar a ser só.